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Daniela Falcone

Daniela Falcone

04 Mar 2020 8 min read

Usando o card sorting para uma navegação com sentido

Era o início do nosso rebrand e estávamos ansiosos para aplicar as novidades ao nosso site. Já tínhamos algum conteúdo, mapeamos outros temas e nosso time de design preparou um sitemap que parecia perfeitamente consistente. Porém, logo nos vimos fazendo perguntas como: “mas esse conteúdo não deveria estar junto daquele?”, “essa seção deveria ter o que, mesmo?”

Gif de porquinhos tentando pular para o sofá, mas caindo de forma fofa

Foi quando percebemos que nossa solução fazia pouco sentido, mesmo quando apenas levemente afastada do contexto do projeto. Tentamos ajustes variados que nunca pareciam ter embasamento suficiente, até que finalmente decidimos buscar um método que provesse uma documentação consistente capaz de solucionar o problema e responder questionamentos futuros: o card sorting.

Aqui, explicarei como estruturar, aplicar e, principalmente, analisar os resultados de um card sorting, além de detalhes da nossa experiência com a técnica.

O método

O card sorting é uma técnica usada para identificar como melhor agrupar tópicos de forma coerente dentro do projeto e compreensiva para o usuário final. O livro Universal Methods of Design (Bella Martin e Bruce Hanington) classifica o método como atitudinal, quantitativo, qualitativo, observacional e auto-reportado.

A dinâmica é fácil e divertida, porém de análise complexa. Ela auxilia a entender a forma que o usuário estrutura a informação e a responder perguntas do tipo:

  • Como meus grupos do menu deveriam ser chamados?
  • Como os usuários desejam ver o agrupamento de informação?
  • Em que parte do meu site os usuários vão procurar determinada informação ou funcionalidade?
  • Quantas categorias são necessárias no menu do meu site?

O card sorting pode ser aplicado de três formas, mas a escolha de qual será usada depende do estado do projeto e o objetivo que se deseja atingir. Independente do tipo escolhido, a aplicação é muito similar, utilizando-se cartões de tópicos e categorias a serem organizados por representantes ou mesmo os próprios usuários do conteúdo. As particularidades de cada tipo serão destacadas sempre que necessário nas seções seguintes.

Tipos

1. Aberto

Os participantes deverão agrupar tópicos e depois dar um rótulo aos agrupamentos (ou categorias) formadas.

Usado para construir e geralmente é aplicado no início do projeto. Auxilia na descoberta de como as pessoas agrupam tópicos e quais rótulos atribuem a cada categoria de modo que faça sentido para seu modelo mental.

2. Fechado

Os participantes deverão agrupar tópicos dentro de categorias pré-determinadas.

Usado para validar e geralmente é aplicado em projetos em andamento. Auxilia no entendimento de como os usuários agrupam tópicos de acordo com categorias já existentes.

3. Híbrido

Os participantes deverão agrupar tópicos dentro de categorias pré-determinadas, mas também podem criar ou remover categorias.

Usado para validar e geralmente é usado como argumento de mudança em projetos. Auxilia a verificar se as categorias definidas fazem sentido para os usuários e quando não fazem é capaz de mapear novas possibilidades de agrupamento.

Como ainda era início de projeto, mesmo com uma categorização definida, optamos por aplicar a abordagem aberta para que pudéssemos colher insights também sobre os conteúdos propostos. Preparando o card sorting

Preparando o card sorting

O método pode ser aplicado tanto presencialmente quanto remotamente, desde que com o auxílio de ferramentas específicas. Neste artigo abordarei apenas minha experiência no primeiro caso.

Participantes

Selecione pelo menos 15 participantes e divida-os de forma individual, em duplas ou trios. Em qualquer configuração, leve em conta que essas pessoas precisam ser representativas no perfil dos usuários finais do seu produto ou, melhor ainda, se realmente forem usuários do produto, sempre incluindo diferentes perfis étnicos e sociais.

Por vezes, pode ser mais interessante formar os grupos por persona, mas no nosso caso a divergência entre os diferentes perfis e seus modelos mentais era mais interessante. Por isso, formamos 5 grupos com pessoas de perfis distintos.

Materiais e local

  • Escolha uma sala livre de distrações, capaz de comportar o grupo confortavelmente e com uma mesa ou quadro largo para dispor os cartões
  • Cartões de tópicos de cor/tipo específico
  • Cartões de categorias de cor/tipo diferente dos cartões de tópicos
  • Quando aberto ou híbrido, forneça cartões vazios e hidrocor/caneta para o grupo escrever os rótulos de agrupamentos

Dicas:

  1. Use cartões de cores/tipos diferentes entre sessões para ajudar na documentação e tenha diferentes cores para usar caso não haja consenso do grupo.
  2. Usamos notas magnéticas para os cards, são post-its que grudam em qualquer superfície e são fáceis de arrastar da tesla amazing 😍

Uma mulher e um homem arrastando notas magnéticas em um quadro branco

Seleção do conteúdo

Crie uma listagem com os tópicos de conteúdo, desde páginas individuais, funcionalidades ou pequenos grupos de uma página do site (ou qualquer outra mídia) e escreva-os em um cartão. Liste apenas os tópicos que você provavelmente irá utilizar, e lembre-se que todos devem ser uma amostra representativa do que você está analisando. Se necessário, acrescente uma breve descrição e/ou use uma ilustração no verso do cartão.

Quando híbrido ou fechado, liste também todas as categorias em um cartão diferenciado dos usados para tópicos.

Aplicando o método

Eu tenho um modo próprio de aplicar dinâmicas em que preparo o ambiente pra deixar as pessoas mais relaxadas e dar um ar descontraído. Isso geralmente inclui bolo de rolo (nosso doce regional mais amado) e música, às vezes aromaterapia; ninguém resiste e logo se engaja. Porém, uma sala com uma grande mesa ou um quadro largo com uma conversa casual antes de começar já é o suficiente.

Além disso, como é prática corrente em dinâmicas de design, sempre tenho um par observador que me ajuda a seguir as seguintes etapas:

Quadro branco com vários cartões espalhados aleatoriamente

  1. Forneça o material, explique o objetivo e peça autorização para qualquer método que você deseje utilizar na documentação (fotos, gravação de voz ou vídeo, etc)
  2. Solicite aos participantes que agrupem os cartões de maneira lógica e se esforcem ao máximo para chegar a um consenso para todos os agrupamentos e quando aberto ou híbrido, que também rotulem as categorias formadas em até 30 minutos.

Neste momento evite interferências, mas sempre estimule que conversem e expliquem uns aos outros ou a você porque estão incluindo um cartão ou rotulando a categoria da maneira escolhida

Você pode determinar um número máximo de tópicos por categoria ou quantas categorias devem ser formadas, dependendo do seu objetivo, mas nós deixamos livre.

  1. Registre os agrupamentos e delibere sobre as anotações com ou sem os participantes
  2. Prepare a próxima sessão espalhando os cartões de maneira aleatória

Escutar os participante durante a ordenação demonstrará como eles pensam, não apenas o que pensam. Anote os comentários e decisões durante toda a sessão, não apenas no final.

Cartões organizados em grupos com papéis rosa destacando o nome dos grupos

Duração

Sessões de 45 minutos, sendo:

  • 5 minutos de preparação
  • 30 minutos agrupando os tópicos (sorting)

Quando aberto ou híbrido, deixar 10 minutos para rotular os agrupamentos

  • 10 minutos de discussão/análise da moderação e para embaralhar os cartões

A escolha dessa abordagem foi baseada em muitas leituras e reflete o contexto do projeto. Ela foi adaptada da abordagem proposta por Nielsen e se provou eficaz ao nosso objetivo. Analisando os achados

Analisando os achados

Para auxiliar a análise, eu criei uma matriz em que pontuei por quantos grupos cada card foi colocado junto a outro. Apesar de formar alguns grupos óbvios, ela sozinha não é capaz de definir a melhor arquitetura de informação.

Matriz de similaridade criada por mim e disponível para cópia

Preparei uma planilha modelo que pode ser copiada para os seus projetos <3

O método que utilizei aqui foi formatado para um card sorting aberto. Portanto, se for um card sorting fechado, ignore as etapas que dizem respeito aos rótulos das categorias.

Quantitativo

  1. Liste os tópicos que foram colocados juntos por todos os grupos e identifique os rótulos dados às suas categorias (100% de consenso)

Resultou em 7 grupos, sendo 4 duplas, 2 trios, 1 quarteto e 13 dos 31 tópicos ficaram desagrupados.

  1. Liste os tópicos sem consenso significativo de pertencimento (<80% de consenso)

Escolhi 80% pela quantidade de participantes e observando a variação nos resultados, o que nos deixou com 4 tópicos desagrupados.

  1. Liste os tópicos que foram colocados juntos por 80% dos grupos e identifique os rótulos dados às suas categorias (80% de consenso)

Resultou na modificação de alguns grupos criados anteriormente e na adição de 2 duplas.

Pode-se também utilizar um dendrograma em card sortings abertos ou híbridos no refinamento deste processo, uma técnica para identificação da ordenação hierárquica ascendente de agrupamentos que provê um agrupamento visual de temas, utilizada por ferramentas dedicadas a esta análise, mas que não reproduzi.

Qualitativo

A escolha do método a seguir foi baseada nos insights colhidos nas sessões e sua intenção era buscar pontos de conexão entre os diversos modelos mentais apresentados.

  1. Agrupe rótulos semanticamente similares e identifique anomalias (rótulos semanticamente diferentes dos demais ou de seus tópicos isoladamente) e verifique se o conteúdo converge com os grupos formados

Aqui conseguimos unir 4 grupos distintos e pequenos em um grupo abarcando 7 tópicos que se conectam em significado

  1. Liste outros relacionamentos (ex: tópicos agrupados aos mesmos cartões, mas que não aparecem juntos)

Resultou na criação de 2 grupos

Resultado

Não existe fórmula mágica para o resultado.

Os achados quantitativos serão capazes de definir que tópicos devem aparecer sempre juntos, enquanto outros devem pertencer a grupos distintos. Já os tópicos sem dados numéricos significativos, deverão ser encaixados mediante uma análise apurada dos achados qualitativos, que dependerá de grupo a grupo, mas também de testes de engajamento posteriores.

Uma vez que grande parte dos resultados é de caráter subjetivo, o card sorting não será capaz de dizer exatamente o que as categorias devem conter ou qual rótulo devem usar, mas nos dará muitos insights de que caminho seguir. Muito embora o método não entregue uma resposta completa, ele traz as pessoas que usam o produto para mais perto (ou para dentro) do projeto, tornando mais fácil compreender os perfis mentais de cada persona e colocá-las no centro do processo de forma amigável e até lúdica.

Assim, podemos usar os achados qualitativos muito além de seu objetivo inicial, tornando o produto mais útil e eficiente. Para nós, o resultado foi um sitemap e grande parte dos relacionamentos entre páginas veio dos comentários nas sessões, apesar de não serem cards pertencentes às mesmas categorias.

Muito além dos resultados para o produto, por <del>causa do bolo de rolo</del> ter sido aplicado em um projeto interno e ser muito leve e divertido, o card sorting também trouxe um bom engajamento das outras equipes com o time de design. Portanto, se você tem dificuldades em disseminar uma cultura de design em sua empresa, essa pode ser a porta de entrada por conta do baixo custo, tempo de aplicação e resultados tangíveis 😉.

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